Lançado em fevereiro deste ano pelo Governo do Distrito Federal (GDF), o programa Vai de Graça, que garante gratuidade no transporte coletivo aos domingos e feriados, começa a redesenhar o cotidiano dos brasilienses e, com ele, parte do mapa econômico da capital.
O impacto mais visível está nas ruas e nos centros comerciais. Dados do Instituto Fecomércio-DF mostram que 96% dos lojistas perceberam aumento no movimento nos dias em que o transporte não é cobrado. Para 51,2% dos comerciantes, as vendas cresceram até 10%; 27,2% registraram alta entre 10% e 20%, enquanto 0,5% viu as vendas saltarem acima dos 30%.
A gratuidade, que antes era vista com desconfiança por parte do empresariado, agora tem sido usada como aliada. Duas em cada dez lojas passaram a adotar promoções fixas aos domingos, enquanto 42% lançam ofertas de forma eventual, aproveitando o maior fluxo de clientes.
Pelo lado do consumidor, 61,6% afirmam que o benefício os estimula a sair de casa, seja para lazer, compras ou ambos. 29% combinam os dois, e 9,4% saem com foco principal nas compras. Antes do programa, 56% dos entrevistados circulavam pela cidade em apenas um domingo por mês. Hoje, 45,7% saem em dois domingos e 15,1% aproveitam todos os finais de semana e feriados, sugerindo uma mudança gradual nos hábitos de mobilidade.
Além do varejo, os reflexos também aparecem na arrecadação tributária. Um levantamento da Secretaria de Economia do DF mostra que, entre março de 2024 e julho de 2025, houve aumento de 5,4% no número médio de notas fiscais emitidas por empresa, e de 8,6% no valor médio dessas notas. A arrecadação do ICMS varejista subiu 5,8% no período.
A política tem reverberado até na inflação. Em maio, o IPCA no DF foi de 0,26%, abaixo da média nacional. Embora sete dos nove grupos de produtos e serviços tenham registrado alta, o índice foi contido, sobretudo, pela queda de 0,52% no setor de transportes — impulsionada por uma redução de 17,2% nas passagens de ônibus urbano. No mês anterior, a retração nas tarifas havia sido de 3,36%. Segundo o presidente da Fecomércio-DF, Aparecido Dantas, o movimento é resultado direto da política de gratuidade.
A demanda pelo transporte também aumentou de forma expressiva. Segundo a Secretaria de Transporte e Mobilidade (Semob-DF), a média de acessos aos domingos saltou de 270 mil para 460 mil passageiros — um crescimento de 70%. Desde março, o programa já contabiliza mais de 20,4 milhões de viagens gratuitas, incluindo domingos, feriados e datas especiais com gratuidade estendida.
O mês de março concentrou o maior número de acessos: cerca de 5 milhões, impulsionados pelos nove dias de gratuidade durante o Carnaval. Desde então, o volume se estabilizou em cerca de 2 milhões por mês, com picos em ocasiões específicas, como no fim de agosto, quando um evento religioso elevou o total mensal para mais de 3 milhões de viagens.
As datas comemorativas ajudam a dimensionar o alcance da medida. O maior pico foi registrado na quinta-feira da Semana Santa (17/4), com 1,25 milhão de acessos. Em seguida, destacam-se a segunda-feira de Carnaval (3/3), com 770 mil viagens, e a véspera do Dia da Independência (6/9), com 748 mil.
A pesquisa também mapeou como a população pretende usar o valor economizado com a gratuidade: 54,4% dizem que gastarão com alimentação, 27,2% pretendem poupar, 9,6% planejam investir em bens físicos e 8,8% em experiências ou lazer.
Para utilizar o benefício, o passageiro pode embarcar usando os cartões Mobilidade, Vale-Transporte, Passe Livre Estudantil, PCD, Idoso ou, ainda, cartões de crédito e débito, que liberam a catraca sem custo adicional.
O perfil dos usuários é relativamente homogêneo: 53,4% são homens, com predomínio das faixas etárias entre 30 e 44 anos (40,8%) e 18 e 29 anos (39,8%). As regiões administrativas com maior participação no programa são Samambaia (16,3%), Taguatinga (11,6%) e Águas Claras (10,9%). Em relação ao modal de transporte, 50% usam ônibus, 23% preferem o metrô, e 27% alternam entre ambos.
Ao garantir deslocamento gratuito em dias de menor movimento, o programa tem funcionado como catalisador para o comércio, estímulo ao lazer e ferramenta de reorganização urbana — conectando bairros e populações historicamente mais afastadas do centro do Distrito Federal.